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A mostrar mensagens de 2018

Natal

Chove. É dia de Natal.  Lá para o Norte é melhor:  Há a neve que faz mal,  E o frio que ainda é pior.  E toda a gente é contente  Porque é dia de o ficar.  Chove no Natal presente.  Antes isso que nevar.  Pois apesar de ser esse  O Natal da convenção,  Quando o corpo me arrefece  Tenho o frio e Natal não.  Deixo sentir a quem quadra  E o Natal a quem o fez,  Pois se escrevo ainda outra quadra  Fico gelado dos pés.  Fernando Pessoa, in 'Cancioneiro'  

Ajuda

Porque o amor é simples, vale a pena colhê-lo, Nasce em qualquer degredo, Cria-se em qualquer chão. Anda, não tenhas medo! Não deixes sem amor o coração! Miguel Torga - Diário III

Do sentimento trágico da vida

Homo sum; nihil humani a me alienum puto, disse o cómico latino. E eu diria melhor: nullum hominem alienum puto ("Sou homem; nenhum outro homem me é estranho"). Porque o adjectivo humanus me é tão suspeito como o seu substantivo abstracto humanitas, a humanidade. Nem o humano nem a humanidade, nem o adjectivo simples, nem o adjectivo substantivado, será o substantivo concreto; o homem. O homem de carne e osso, o que nasce, sofre e morre sobretudo morre; o que come e bebe e joga e dorme e pensa e quer, o homem que se vê e a quem se ouve, o irmão, o verdadeiro irmão. Miguel de Unamuno, Do Sentimento Trágico da Vida , trad. de S. Stacey.

"A Memória"

São raros aqueles que teimam em viver, sob a excomunhão do Maior Número, que os crisma de malucos, poetas, criminosos, mágicos! Mas que admirável espectáculo, o do homem que vive, até à hora da sua morte! Eu vos abençoo, malucos, lunáticos, mágicos, criminosos, poetas! E os que saem para a rua, sem chapéu, por divino esquecimento! E os que vão a falar só, pelos caminhos... e os que olham a lua, latindo intimamente... e os que se não conformam, os que não seguem a lei e o costume, todas as criaturas onde o campo o anjo da infância sobrevive. Teixeira de Pascoaes, Verbo  Escuro , "A Memória", Assírio & Alvim.

Gaia Ciência

E se um dia ou uma noite um demónio se esgueirasse na tua mais solitária solidão e te dissesse: "Esta vida, assim como tu a vives agora e como a viveste, terás de vivê-la mais uma vez e ainda inúmeras vezes: e não haverá nela nada de novo, cada dor e cada prazer e cada pensamento e suspiro e tudo o que há de indizivelmente pequeno e de grande em tua vida há de te retornar, e tudo na mesma ordem e sequência..." Como não atirar-te ao chão, rangendo os dentes e amaldiçoando o demónio que assim te falou? Ou já alguma vez experimentaste aquele formidável momento em que lhe terias respondido: "És um deus, e nunca ouvi algo mais divino"... Como te terias tornado tão bem disposto perante ti mesmo e a vida para chegar a não desejar alguma coisa mais ardentemente que este supremo desígnio e esta confirmação eterna? F. Nietzsche, Gaia Ciência , IV, 341, trad. de António Marques, Relógio d'Água.

La Dolce Vita

Frequentemente, pela noite, a escuridão e o silêncio caiem sobre mim. A paz assusta-me. É a ela que temo, talvez acima de tudo. Sinto-a como simples máscara, cobrindo a face do inferno. Medito no que o futuro reserva aos meus filhos: "O Mundo será maravilhoso", dizem. Do ponto de vista de quem? Somos forçados a viver num estado de suspensão, como obras de arte; num estado de encantamento... distanciados. Distanciados. Frederico Fellini, La Dolce Vita , trad. S. Rafael.

Odes

Não só quem nos rodeia ou nos inveja Nos limita e oprime; quem nos ama            Não menos nos limita. Que os deuses me concedam que, despido De afectos, tenha a fria liberdade           Dos píncaros sem nada. Quem quer pouco, tem tudo; quem quer nada É livre; quem não tem, e não deseja,           Homem, é igual aos deuses. Ricardo Reis, Odes , Clássica Editora.

De Profundis

Não há na mesma alma lugar para as duas paixões. Não podem as duas morar na casa finalmente esculpida. O amor tem na fantasia o seu sustento. É através dela que nos tornamos mais sábios que aquilo que julgamos, melhores que aquilo que supomos, mais nobres que aquilo que somos. É através dela que a vida é compreendida inteira. É através dela, e só através dela, que os outros são pensáveis nas suas ligações reais assim como nas suas ligações ideais. Só o que é belo e delicadamente concebido satisfaz o amor. Ao ódio, porém, qualquer coisa engorda. Oscar Wilde, De Profundis , Trad. de Alfred Stacey, Relógio d'Água.

O mito de Sísifo

Posso refutar tudo neste mundo que me rodeia, me fere ou me transporta, excepto este caos, este acaso rei e esta divina equivalência que nasce da anarquia. Não sei se este mundo tem um sentido que o ultrapassa. Mas sei que não conheço esse sentido e que me é impossível, neste momento, conhecê-lo. Que significa para mim significação fora da minha condição? Não posso compreender senão em termos humanos. O que toco, o que me resiste, eis o que compreendo. E estas duas certezas, a minha fome de absoluto e de unidade e a irredutibilidade deste mundo a um princípio racional e razoável, sei também que não as poderia conciliar. Que outra verdade poderia eu reconhecer sem mentir, sem fazer intervir uma esperança que não tenho e que nada significa nos limites da minha condição? Albert Camus, O mito de Sísifo , trad. de M. Vieira, Livros do Brasil.

A Náusea

O essencial é a contingência. Quero dizer que, por definição, a existência não é a necessidade. Existir é estar presente, simplesmente; os existentes aparecem, deixam que os encontremos, mas nunca se podem deduzir. Há pessoas, creio eu, que perceberam isto. Somente, tentaram dominar essa contingência inventando um ser necessário e causa de si próprio. Ora, nenhum ser necessário pode explicar a existência: a contingência não é uma ilusão de óptica, uma aparência que se possa dissipar; é o absoluto, por conseguinte a gratuitidade perfeita. Tudo é gratuito. Este jardim, esta cidade e eu mesmo. Jean Paul-Sartre, A Náusea , trad. de A. Coimbra Martins, Publicações Europa-América.

Gravidade e Graça

O tempo, propriamente dito, não existe (excepto o presente como limite), e, no entanto, estamos submetidos a ele. É esta a nossa condição. Estamos submetidos ao que não existe. Quer se trate da duração passivamente sofrida dor física, esperança, desgosto, remorso, medo, quer do tempo organizado ordem, método, necessidade, nos dois casos, aquilo a que estamos submetidos, não existe. Estamos, realmente, presos por correntes irreais. O tempo, irreal, cobre todas as coisas e até nós mesmos, de irrealidade. Simone Weil, Gravidade e Graça , Ed. Martins Fontes.

Cartas a Lucílio

O que tens a fazer antes de mais, caro Lucílio, é aprender a ser alegre. Estás a pensar que eu te quero privar de muitos prazeres ao afastar de ti os bens fortuitos, ao entender que devemos subtrair-nos ao doce canto das sereias que é a esperança? Pelo contrário, o meu desejo é que nunca te falte a alegria. O meu desejo é que a alegria habite sempre em tua casa; e fá-lo-á, se começar a habitar dentro de ti. Os outros tipos de alegria não satisfazem a alma; desanuviam o rosto, mas são superficiais. A menos que entendas que estar alegre é estar a rir! Não, a alma deve estar desperta, confiante, acima das contingências. Acredita-me, a verdadeira alegria é uma coisa muito séria. Séneca, Cartas a Lucílio , III; 23; 3-4, trad. de J. A. Segurado e Campos, Fund. Calouste Gulbenkian.

Pensar

Os valores passam. E as religiões. E todos os sistemas complicados de madura reflexão. E o mais. O homem fica. Como não fixar nele o absoluto de tudo? Decerto um dia morrerá também. Mas o antes e depois dele não existem. Valerá a pena falar disso? Valerá mesmo a pena insistir no valor da vida, que é a evidência primeira antes de toda a evidência? deixa os outros discutirem entre si a enrolarem-se na aflição de concluírem o que tu já concluíste ao abrires os olhos sobre ti. Antes e depois não há mais nada. E no intervalo está tudo. Não há razão nenhuma que demonstre que o sol existe, excepto o existir. Negar a razão à vida é dá-la à morte. Porque é que hás-de fazer a troca? Olha o sol. Aquece-te. Estás bem. Vergílio Ferreira, Pensar , Bertrand Editora.

Poesia do Século XX

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APLG - 30 Anos

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A APLG (Associação de Professores de Latim e Grego) comemora 30 anos de existência e trabalho em defesa da Cultura e das Línguas Clássicas. Segue-se o programa das comemorações e a respectiva ficha de inscrição.

Curso de Iniciação ao Latim

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Ficha de insrição aqui:   https://docs.google.com/forms/d/1-RHf0jUA_N7oMh0jurIb5YfH5bZ5M-d2s7_4OshVvas/viewform?edit_requested=true Site da APLG (Associação de Professores de Latim e Grego):  https://aplg36.wixsite.com/aplgpt

I Encontro Nacional de Professores de Estudos Clássicos

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Ver programa aqui:  http://www.uc.pt/++preview++/fluc/docspdf_agenda/enpec_programa.pdf

Acção de Formação

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Acção de Formação de Curta Duração sobre as Aprendizagens Essenciais. Duas sessões: Lisboa e Coimbra.     A ficha de inscrição encontra-se no site: https://aplg36.wixsite.com/aplgpt .

Nascemos para amar

Nascemos para amar; a Humanidade Vai, tarde ou cedo, aos laços da ternura. Tu és doce atrativo, ó Formosura, Que encanta, que seduz, que persuade. Enleia-se por gosto a liberdade; E depois que a paixão na alma se apura, Alguns então lhe chamam desventura, Chamam-lhe alguns então felicidade. Qual se abisma nas lôbregas tristezas, Qual em suaves júbilos discorre, Com esperanças mil na ideia acesas. Amor ou desfalece, ou para, ou corre; E, segundo as diversas naturezas, Um porfia, este esquece, aquele morre. BOCAGE, 1969. Opera Omnia . Vol. 1.