Textos para reflexão II

TEXTO 3

“[...] In illo tempore, isto é no tempo em que os Romanos ocupavam a Península Hispânica, o latim era a língua oficial de todos os nossos antepassados. O tempora, o mores!
Depois da saída dos Romanos, a língua latina evoluiu, dando origem às línguas românicas. Aqui, na Península, distinguem-se o Português e o Castelho (e também o Catalão e o Galego). Noutras regiões do Império, o latim está na base do Francês, do Romeno e do Italiano.
Daí a semelhança entre todas estas línguas, como podemos observar em alguns exemplos:
português: mar; latim: mare; italiano: mare; francês: mer; castelhano: mar.
Com o Cristianismo, o Latim continuou a ser a língua da Igreja, que procurou conformar o léxico latino às exigências da sua doutrina, dando a vocábulos clássicos novos sentidos, introduzindo outros, adaptando do grego, etc. Assim a língua latina se enriquece, ganha novos valores semânticos, simplifica-se tornando a estrutura escrita muito mais perto da oral, para mais facilmente se chegar às classes menos letradas.
Durante a Idade Média, o latim continuou a ser usado em Portugal em documentos oficiais, com algumas deturpações em relação ao latim clássico, adaptando-se a novas situações, a uma linguagem própria dos documentos em questão. É o chamado, por isso mesmo, latim tabeliónico.
Com o Renascimento e o Humanismo, dá-se um grande ressurgimento da língua latina. Os Humanistas dedicam-se ao estudo dos grandes autores clássicos latinos e procuram imitar-lhes o estilo, em obras dos mais variados géneros, da poesia à prosa, da oratória à poesia lírica, da história ao género trágico. Por sua vez, a língua portuguesa enriquece-se com novos termos, formados de um latim mais clássico e aptos a designar o universo cultural da época. São os termos eruditos que se introduzem no português, procurando, por vezes, o sentido clássico para vocábulos que o latim vulgar tinha adaptado a realidades mais práticas.
É assim que do mesmo étimo latino, nos aparece ao lado de cadeira, cátedra; ao lado de mancha, mácula; alhear e alienar; cheio e pleno, etc., as primeiras vindas por via oral e popular, sujeitas por isso a maiores transformações; as segundas por via erudita, através do texto escrito.
Ao longo dos tempos, o latim tem continuado a ser a língua de referência para a formação de neologismos relacionados com as áreas técnicas e científicas, e até o bem moderno computador, que teve a sua origem na língua inglesa, é, afinal, derivado do latim computare 'contar' (o computador era aquele que fazia cálculos – o homem – e passou a designar o agente mecânico que, entre outras coisas, faz cálculos – a máquina).
Mas, como a língua é o veículo de uma cultura, a cultura Romana, tão enraizada em toda a moderna cultura ocidental, faz com que vocábulos e expressões latinas sejam de uso comum em português (tal como noutras línguas). Deste modo, o latim não será nunca uma língua morta, antes uma língua que não é falada, mas que aparece, a todo o momento, no nosso dia-a-dia.
Por isso, ouvimos dizer que uma reunião foi adiada sine die, que foi constituída uma comissão ad hoc para tratar determinado assunto, que aquela questão gerou um qui pro quo que deixou todos bem dispostos, que um lapsus linguae deixou o deputado embaraçado, que todo aquele discurso era apenas um pro forma, etc., etc.
É, também, o latim do nosso dia-a-dia que nos leva a enviar o curriculum vitae quando pretendemos concorrer a um emprego, ou a arranjar um alibi para nos livramos de determinada acusação.
Podemos então afirmar que o latim é uma língua morta?!
No comércio ou na cultura não faltam os empréstimos latinos, quer nos nomes das empresas, quer nos lemas publicitários, nas “bandeiras” das universidades ou nas editoras livreiras, etc.
Os Romanos deixaram-nos, na realidade, uma herança cultural que convive conosco diariamente nas mais variadas situações.

Texto extraído de MARTINS, Isaltina & FREIRE,
M.ª Teresa (2004). Noua Itinera10.º ano. Porto: Edições Asa.

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